
Estresse, conflitos e casos de polícia: transporte por aplicativo é arena para episódios de violência
“Diversas vezes pensei em mudar de ramo“. É em tom de desabafo que o motorista por aplicativo Ubiratan Sales Carvalho, de 54 anos, fala da profissão que exerce desde 2019. Ele foi vítima de assalto duas vezes em Salvador. Com cargas de trabalho que podem ultrapassar 10 horas diárias, os profissionais enfrentam a rotina permeada por estresse no trânsito, eventuais conflitos com passageiros e apreensão diante de episódios de violência.
De acordo com o Sindicato de Motoristas por Aplicativo da Bahia (SIMACTTER), foram registrados, nos primeiros quatros meses de 2023, 39 furtos e roubos denunciados por associados no estado. A morte de Marcos Luis Silva foi a primeira notificada pela entidade em 2024.
Esse contexto social também é observado pelo psicólogo da Holiste Psiquiatria, André Dória. Mestre em Psicologia, ele destaca que o trânsito é também um recorte do tempo que reflete determinado período da história.
“Se a gente estivesse conversando sobre trânsito há 30 ou 20 anos, o que chamaria atenção seriam os números de mortes por atropelos. Mas hoje o que a gente conversa é sobre violência”, destaca.
Tensão no trânsito
Outro fator que coloca motoristas por app sob estresse é justamente o tráfego de veículos, o que exige paciência e atenção redobrada. Isso porque, além do risco de acidentes, são comuns os registros de conflitos entre condutores, pedestres e passageiros.
Um desses casos, no último domingo (5), culminou na morte de um passageiro, em Itabuna, no sul do estado. José da Paixão Santos estava no banco do carona do carro quando foi baleado pelo motociclista que discutia com o motorista.
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José da Paixão Santos estava dentro de carro por aplicativo quando foi baleado em Itabuna — Foto: Arquivo da família
O suspeito do crime fugiu e até o momento não foi localizado. Um homem chegou a ir na delegacia, mas negou participação no caso e foi liberado.
Relacionamento com o público
Um terceiro aspecto que pode acarretar problemas aos motoristas por aplicativo está diretamente ligado ao propósito do trabalho: a relação com os passageiros. Não são raras as denúncias de conflitos registradas por ambas as partes.
Em janeiro deste ano, um condutor foi mordido por uma passageira por ter se recusado a ligar o ar-condicionado. Esse caso também ocorreu em Salvador.
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Motorista de aplicativo mostra marca da mordida na testa — Foto: Reprodução/TV Bahia
À época, Vinicio Ribeiro registrou um boletim de ocorrência. A mulher prestou depoimento e foi liberada.
Em novo contato com o g1, ele destaca que essa não foi a única vez em que foi agredido no exercício da função. “Já sofri os seguintes crimes: calúnias, difamações, injúrias e danos ao meu patrimônio”, relembra.
Ribeiro atua nos apps há mais de dois anos e ressalta que nunca se sentiu seguro no trabalho, seja pela “crescente onda de violência” ou pela “falta de garantias tanto por parte das plataformas quanto do estado”.
O que dizem as plataformas?
O g1 entrou em contato com as principais plataformas do setor para apurar qual o procedimento adotado quando casos de violência são registrados.
Por meio de nota, a Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia (Amobitec), que reúne plataformas como Uber e 99, informou que há investimentos e trabalhos continuados para buscar cada vez mais proteção e ferramentas tecnológicas que ampliem a segurança de motoristas, motociclistas e usuários do sistema.
A associação reforça que “cada empresa associada dispõe de políticas próprias de segurança, possuem equipes especializadas para colaborar com autoridades e colocam-se à disposição do Poder Público para contribuir com iniciativas que busquem avanços na segurança dos usuários”.