Ideias simples a solução problemas complexos
Lisboa – A arquiteta e urbanista Ana Pinho, Secretaria de Estado da Habitação em Portugal, que chegou ao governo em 2017 e que quase ninguém conhecia, foi capaz de, em apenas nove meses, montar um programa destinado a resolver o problema da falta de moradia para a população que vem sendo expulsa dos centros da cidades pelo turismo descontrolado e para os sem abrigo nas capitais e no interior.
Ideias simples que podem resolver questões complexas. Uma iniciativa que valeria a pena ser implantada no Brasil, possivelmente, custaria menos do que a construção de novas moradias do programa Minha Casa Minha Vida, com vantagens para os mais pobres. Poderiam ter a oportunidade de residir nas áreas mais centrais das cidades e não no fim de mundo, penando horas em ônibus caindo aos pedaços, entre sua casa e o trabalho, como é a regra brasileira.
Especialistas no assunto já analisaram os custos das casas do Programa Minha Casa Minha Vida, a maioria na periferias das metrópoles, e concluíram ser mais barato edificá-las em áreas com infra-estrutura existente. Como nesses locais ermos não há rodovias, saneamento básico, eletricidade, esgoto, telefonia, escolas, transporte, mercados e demais equipamentos urbanos indispensáveis ao bem estar das pessoas, em alguns casos, seria mais barato instalá-las na Avenida Paulista. Mas essa possibilidade, é claro, nem passa pela cabeça dos nossos dirigentes políticos. Melhor manter os pobres à distância.
A Secretaria Ana Pinho realizou levantamento dos imóveis devolutos do Estado, desocupados e necessitando de reformas. Sob sua inspiração, foi criado programa intitulado “Nova Geração de Políticas de Habitação”, que poderia ser resumido numa regulação liberal do mercado, através de um choque fiscal. O governo renuncia à cobrança de parcela dos impostos devido pelos proprietários de imóveis que, em troca, cobrariam menos pelos aluguéis de longo prazo. Tornando esses aluguéis financeiramente mais atraentes, o governo português busca reduzir sua exploração pelos Airbnbs da vida. E fez mais: oferece aos proprietários seguro para eventuais inadimplências dos novos inquilinos.
O programa inclui ainda a reabilitação de imóveis devolutos, ou mesmo a edificação de novos em seu local, quando não for possível recuperá-los, para alugá-los com preços praticamente simbólico aos sem teto. Com isso, mata vários coelhos de uma só vez. Aumenta a oferta de casas para os residentes locais, que estão sendo expulsos das suas moradias pelos proprietários que só querem alugá-las aos turistas. Cria residências para quem não possui e incentiva o retorno ao interior, que está ficando deserto em Portugal. Recupera o patrimônio deteriorado do governo, como o edifício do Policia Federal em São Paulo, que desabou deixando mortos e mais desabrigados.
Às vezes, o que parece simples pode ser complexo. Ana Pinho empenhou-se e foi convincente a ponto de convencer o governo, num momento em que sua prioridade é reduzir o déficit público, a renunciar a parte da receita fiscal em favor dos mais desfavorecidos. Algumas pessoas julgam que, no momento, quando o país ainda não se recuperou da crise, esse considerado equivocadamente gasto, não é a melhor estratégia. Mas a iniciativa da Secretaria de Habitação deve ser vista como investimento, que somente bons retorno produzirá.
A ideia poderia ser adotada no Brasil, onde são inúmeros os imóveis oficiais que estão desocupados, abandonados e com risco de desabamento,como o de 24 andares da Polícia Federal em São Paulo. Se houvesse um programa como a que acaba de ser implantado em Portugal, a maioria dos problemas resultantes da falta de residência para todos, um direito constitucional, poderia ser equacionada e, possivelmente, com menos dinheiro, desde, é claro, que não haja desvio para corrupção.
Fonte: DP – Silvia Caetano
Foto em detaque Lisboa – Portugal
https://pt.wikipedia.org/wiki/Lisboa